Descrição / Abstract
O presente trabalho trata da transição entre o escravismo colonial e o capitalismo dependente na cidade do Rio de Janeiro. Partimos de uma extensa discussão bibliográfica que visou revalidar a singularidade do escravismo enquanto modo de produção, apresentada originalmente por Jacob Gorender. Para tanto, cotejamos as recentes críticas e contribuições tanto com as proposições do autor, quanto com as interpretações oferecidas pela Teoria Marxista da Dependência e pelas Teorias dos Sistemas-Mundo, a fim de elaborar um instrumento de análise capaz de examinar o período transicional. Para este intuito, a definição de “revoluções tecnológicas” desenvolvida por Darcy Ribeiro possibilitou a elaboração do conceito de transição dependente. Munidos desta ferramenta, investigamos, ainda na primeira parte, o ciclo transicional do capital em sua transformação histórica de padrões de acumulação simples e ampliada, e o papel do Estado enquanto condensação material das lutas sociais no favorecimento ou retardo da transição. Em seguida, procedemos à apreciação dos elementos característicos da reconfiguração da dinâmica sócio-ocupacional na cidade do Rio de Janeiro, tendo como momento inicial a promulgação da Lei “do Ventre Livre” em 1871 e, final, o ano de 1920, através da utilização crítica dos dados presentes nos recenseamentos realizados em 1872, 1890, 1906 e 1920. Dada a inconsistência e discrepância de critérios nos levantamentos demográficos, propusemos uma metodologia de equivalência de modo que os quantitativos profissionais pudessem ser comparados em sua evolução. Sob esta perspectiva, nos valemos dos anúncios contidos no Almanak Laemmert como dispositivo autônomo de observação e ao mesmo tempo como possibilidade de corrigir a inexatidão dos Censos. Nosso principal objetivo foi o de explorar a conformação das classes subalternas e oprimidas a partir do ocaso do escravismo diante do processo inaugural de industrialização do espaço urbano carioca. Neste sentido, apresentamos o conceito de ganho como performance de reprodução da força de trabalho que supera os “escravos ao ganho” e os “ganhadores livres”, regularmente inscritos pelo Estado, e alcança, por um lado, a transitoriedade e volatilidade de acesso a postos de trabalho e, por outro, a insuficiência da geração proporcional desses mesmos postos, provocada pelas transformações econômicas do período em confronto com o acelerado crescimento populacional. Finalmente, consideramos a atuação estruturante de mecanismos ideológicos tais quais o racismo e o patriarcado na distribuição dos indivíduos nos estratos da hierarquia social.